domingo, 7 de outubro de 2007

Escape

Fui vestida de qualquer jeito, com os cabelos ondulados e de cara lavada. Nem sequer um brilho labial, nem um rímel, nem nada. Meus jeans Carmim desbotados, casaco de moletom Everlast cinza e Nikes prateados meio sujos. Grande coisa. Ele me ama de qualquer jeito. Ele me ama bonita, bêbada, embrutecida, esgotada, inconsciente, triste, magoada, nas últimas. Descolei um ar blasé copiado de alguma atriz famosa, uma superioridade tão visível como água e arrastei minha carcaça à luta. Estava marcado para a cinco da tarde mas me dei ao luxo de me atrasar uma meia hora, visto que não encontrava nenhum táxi e não tinha a menor vontade de me juntar a ele. Pensei sete mil vezes antes de entrar naquele Café e dar de cara com ele, sempre ele; o meu escape. Inspirei com volúpia uma lufada de ar e entrei. Oi... beijinho... senta... já pedi um café arábico pra mim, você quer alguma coisa?... só um minuto... não vá me dizer que não quer?... entendo... faz quanto tempo que a gente se conhece?... três anos... é, é tempo pra caramba... lembra aquela noite que eu te levei pra casa e a gente encontrou os teus pais?... sei, bons tempos aqueles... e foi por acaso... nós tínhamos ido só passear, não era pra acontecer... mas vai dizer que você não gostou?... whatever... como você está loira... eu não sei se você sabe, mas é verdade... chérie, grande coisa... vamos embora... prefiro caminhar, hoje está bom... não está com frio?... te empresto meu casaco... é engraçado como são essas coisas... você sempre diz isso... então vem cá... a vida inteira a gente vai sempre se ver, apesar de tudo o que estiver acontecendo... eu acredito... nós dois... ainda bem que você nunca me viu nesse estado... eu te vejo serena... mas você não sabe como são essas coisas... como sua mão está quentinha... eu é que sou sangue frio... você sabe que me ama.

Mesmo sem brilho labial, de cara lavada e coração vazio. Lábios cheios, olhos fechados, pensamento em outra pessoa. Mãos juntas, pele e pele, olhos mergulhados. Meus cílios tocando a pele dele, seus cabelos louros, nossos movimentos impensados. O porquê de sempre acabarmos saindo juntos, o seu colo, a maneira como ele me olha. As recaídas, os filmes nunca assistidos, os calafrios do passado. Línguas buscando algo mais do que um beijo, corpos estreitados, dor de estar vivo. Mesmo sem amor, sem perder nem ganhar. O beijo demorado e quente, o sorriso... foi quando eu amei ele por dois segundos e pensei: puta que pariu, como estou feliz. Durante a vida inteira a gente sempre vai se encontrar. Triste ou feliz, depravada ou inteira. Todas aquelas palavras trocadas sem paixão nenhuma e o coração palpitando.

Depois, o abraço:

4 comentários:

Jana disse...

Sabe o que eu me pergunto? Porque não conseguimos ser feliz apenas com isso???????

Beijos

R. disse...

Respondendo à Jana, pq a gente é burro pra cacete. Não canso de me perguntar se é burrice, se é karma, se são ambos. Mas, já cantou Chico "a gente vai levando...".

Tenho que dizer que morri de rir com o seu comentário sobre homem de terno "acho digno", rs... E seu pai tem uma boa adega, é? Hum...

Bjs!

Anônimo disse...

definitivamente... vc escreve muito bem, não deixa passar nenhum detalhe.

A sensação q tive é de ter estado ali quando aconteceu esse encontro...

ééé.. parabéns...
beijooos

Dani disse...

Concordo com a Jana. No fundo, a gente sempre quer mais do que isso né?
Bjosssss