quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

Não-sonho.


Ontem mesmo, passei o dia mergulhada na vastidão contorcida da minha crise. Sozinha, sem livros, nem companhia. Era mais do que não ter o que vestir ou olhar para pessoas relativamente magras, era impotência, uma impotência que reomoía meus pensamentos e me arremessava na tontura de um sonho ruim, uma bad trip. Tentei escrever, mas meus dedos estavam bêbados. Tentei ler, mas a minha cegueira progressiva me impediu. Tentei, ainda, tomar banho e sair para fazer compras, mas estava um trapo. Talvez o problema fosse eu, estava precisando de uma boa dose auto-estima, uns sapatos novos, quem sabe. Ou talvez não fosse isso. Entreguei-me à Leo Ferre e deixei meu inconsciente viajar através de seus ruídos melodiosos e retilíneos, traguei angústias, renovei meu rosto, transei com ilusões e continuei intacta. Era um daqueles momentos nostálgicos que nascem de dentro de uma música e morrem quando a mesma acaba. Tomei um chá e vomitei em seguida. Sentei no sofá para, logo, levantar-me, minhas coxas estavam repuxando. Ostentei o brilho dos meus olhos por um segundo, eram lágrimas que brotavam. Liguei para algumas pessoas cujos celulares caíam na caixa de mensagens. O colchão sustentou meus pulos, deslisei pelo mesmo e me acomodei. Sentei-me na sacada: por trás dos meus óculos escuros os meus olhos resplandeciam o sol que ia sumindo, cor de Bagdad Cafe. Observei as estrelas surgindo, uma a uma, elas se pareciam comigo, plácidas e imaculadas. Não que eu estivesse exatamente daquele jeito mas eu eu era assim no meu estado normal. Sem dúvidas, naquele momento, eu estava péssima. Estava caindo na real, percebendo o meu vazio se multiplicar em milésimos. Talvez fosse relutância minha em querer enxergar o lado bom das coisas, talvez não existisse esse lado. Passei minutos, segundos, horas, não lembro, contemplando o céu, assistindo o sol se dissipar atrás dos prédios delineados e ouvindo nada mais do que o barulho daqueles carros de luxo desfilando pela avenida. E de repente, só restou um gosto familiar na minha boca: o gosto de fim. O fim da tarde, o fim do meu enfado e o fim do meu não-sonho.

domingo, 25 de fevereiro de 2007

Perdida

Alguma razão palpável?

engano.
dano.
Olhos resistem ao dia
ouvidos selecionam agressões.
O tempo inteiro controlando:
olhar de lince, mãos escondidas.
Culpa sobreposta nos espinhos.





(espero que amanhã seja melhor, bela merde)

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

Reminiscências


Não era simplesmente sorrir sem motivo, alguma coisa havia mudado. A minha mania de não confiar em ninguém, de me isolar no meu mundinho havia sido interrompida por uma das pessoas a qual eu mais confiei em toda a vida, talvez, a única amiga que eu já tive. Foram momentos escassos porém únicos, era impossível que alguém pudesse roubar as nossas peculiriadades, nossos silêncios, abraços, palavras sem nexo e ,principalmente, a nossa subjetividade. Algumas atitudes eram mal interpretadas, as desculpas, esfarrapadas, mas de qualquer forma ela continuava sendo a minha amiga, a minha menina, minha quase irmã, e isso ninguém tirava dos nossos pensamentos, por mais que o tempo passasse e nós nunca mais nos víssemos, porque algo que aprendemos uma com a outra sempre foi valorizar o elo que nos ligava emocionalmente, mesmo que as outras pessoas não importassem pra gente ou que elas simplesmente nos esnobassem, nós realmente não estávamos nem aí, continuávamos falando as velhas frases feitas, abusando dos mesmos clichês e sendo sinceras acima de tudo, sem brigas, sem discussões, sem tempo. Na verdade, tudo era raro entre a gente. E acho que foi essa raridade que nos uniu tanto, embora, ela seja apenas uma memória hoje em dia, quase imperceptível, como se nunca tivesse existido.


terça-feira, 20 de fevereiro de 2007

Desatinos

Paridos dos meus soluços inócuos
penetram n'alma estes desatinos,
e nas maçãs pálidas da face
amanhecem os sinos poluídos
de ilusão.

Esvaem-se pelos pêlos
essas alucinações,
onde emergem plácidas gotas
de vaidade degenerada
sob a ação do tempo.

A cortina despenca:
feita de cetim e renda
para enfeitar meus desatinos,
e encolhe a esperança nascida num dia de sol
à boca dos olhos resplandecentes.

A covarida escorre entre os dedos.
Corre o medo, correm os anéis.
É hora de se aconchegar
no azul-marinho do céu da boca.

Mais um...

É, mais um. Amanhã eu posto algo melhor. Estou desconcentrada hoje, pelo carnaval, pelo tédio, pela culpa.

Carnaval, é? Aqui nessa cidade? Tô fora. Coloco meus fones de ouvido no volume mais alto e ouço minhas músicas para encobrir as músicas idiotas que tocam lá fora. Prefiro ficar aqui trancada e sozinha do que me deparar com traseiros de fora, garotas escoradas nas suas plataformas de borracha, sua maquiagem totalmente exagerada e fora de moda e seus amiguinhos idiotas.

ouvindo: C'est extra, Leo Ferre.